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Presidente da CPG avalia a Pós-graduação do ICB a partir dos dados da Plataforma Sucupira

03/12/2021 

 

À frente da Comissão de Pós-Graduação (CPG) desde agosto de 2019, a professora Maria Luiza Morais Barreto de Chaves, do Departamento de Anatomia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, deixará o cargo em janeiro próximo. Uma de suas últimas contribuições como presidente da CPG foi fazer uma análise, a pedido da Diretoria, do conjunto de documentos depositados em maio de 2021 junto à Plataforma Sucupira. A análise teve como base os relatórios dos 6 (seis) Programas de Pós-graduação (PPGs) do Instituto, referentes ao quadriênio 2017-2020, cujos dados são utilizados pela  Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) para avaliação dos Programas de Pós-graduação. O foco principal foram as Linhas de Pesquisa desenvolvidas junto aos Programas. Nesta entrevista, a professora aponta quais foram as principais constatações que fez no estudo e que, em sua opinião, merecem uma discussão mais ampla dentro do ICB.

 

Newsletter ICB: Em seu estudo, a senhora constatou que os PPGs do ICB, em termos de relevância, são homogêneos em excelência. Pode nos explicar melhor isso?

Profª Maria Luiza: É nítida a mudança na percepção da avaliação da pós-graduação do Instituto. A CAPES certamente continua a ter um importante papel na progressão das notas; progressão que é sempre ambicionada pelos Programas. No entanto, do meu ponto de vista, hoje, a avaliação dos PPGs do ICB não tem mais a relevância que tinha anos atrás. No passado, havia a nítida percepção de que um PPG era melhor do que outro e as notas refletiam isso. Hoje os PPGs são bastante homogêneos, em termos de excelência, embora ainda haja diferentes notas quanto à avaliação da CAPES. Nesse contexto, parece haver um consenso no ICB de que temos uma pós-graduação de qualidade e muito mais homogênea. Assim, a avaliação realizada dentro dos próprios PPGs, o que chamo de um olhar para dentro, passou a ter o papel de auxiliar os PPGs a quererem superar os seus próprios desafios, na busca de indicadores de qualidade cada vez melhores. Essa superação dos desafios de cada PPG ocorre a partir dessa auto avaliação, que é sistematizada pelo fato de haver uma avaliação quadrienal dos Programas, realizada pela CAPES.

Entendo que hoje não existe qualquer dúvida em relação à excelência dos PPGs do ICB, assim como não mais se observa a “competição” por qual Programa é melhor. Talvez porque sejamos mais homogêneos e as notas não reflitam exatamente um índice final de qualidade. A percepção é a de que as notas atribuídas aos PPGs refletem diferenças pequenas em itens específicos. Além disso, existe muito mais cooperação entre os PPGs, evidenciando um amadurecimento que é muito salutar do ponto de vista institucional. É a pós-graduação do ICB se notabilizando como um todo, e não um Programa específico.

 

Newsletter ICB: Essa homogeneidade se reflete em outros aspectos?

Profª Maria Luiza: Se olharmos os regulamentos dos 6 PPGs do ICB, iremos constatar que são quase iguais, salvo algumas particularidades muito pontuais, se é que existem. Basicamente a maior diferença consiste no elenco de disciplinas oferecidas por cada PPG, que reflete diretamente as respectivas áreas. E em alguns casos, nem mesmo as disciplinas, pois algumas delas ‘transitam’ pelos 6 PPGs e servem de base sólida à formação de todos os estudantes, independentemente do Programa.

 

Newsletter ICB:  A senhora acredita que essa homogeneidade maior poderia contribuir com novas fusões de PPGs no ICB?

Profª Maria Luiza: Sim, certamente existe espaço para que novas estruturas de PPGs se estabeleçam no ICB e a análise mostra isso. Foi uma análise pormenorizada dos relatórios Sucupira dos 6 PPGs. Esses relatórios contêm os indicadores dos PPGs (quantitativos e qualitativos) de 2017 a 2020, período que chamamos de quadrienal. Os relatórios compõem um quadro fiel de tudo o que foi produzido pelos PPGs durante o período, não só indicadores quantitativos e qualitativos de produção, mas a organização das linhas de pesquisa em torno de grandes temas da área do PPG. Lendo com atenção esses relatórios, observamos que as linhas de pesquisa do ICB se distribuem em dois grandes blocos, com um terceiro que representa um ponto de intersecção entre esses dois. Dessa forma, os dados nos desafiam a refletir sobre a possibilidade, ou talvez a estratégia, que deva ser discutida no Instituto a respeito da criação de dois grandes PPGs. Esses, abarcariam o conjunto de linhas de pesquisa dentro de cada um desses blocos. Teríamos que discutir as vantagens e desvantagens desse processo de fusão. Não seria fácil articular e montar essa proposta, do ponto de vista burocrático. Mas a discussão, a meu ver, é importante e necessária. E é a partir da discussão que podemos avançar.

 

Newsletter ICB:  Como estariam organizados esses dois blocos temáticos que a senhora cita?

Profª Maria Luiza: A análise dos relatórios Sucupira evidenciou que os projetos de pesquisa do ICB se organizam ao redor de dois grandes eixos: um em torno das Doenças Infecciosas/Parasitárias, e nesse eixo encontramos os projetos relacionados aos PPGs de Microbiologia e da Biologia da Relação Patógeno-Hospedeiro; outro com projetos de pesquisa em torno principalmente de temas como Doenças Metabólicas (obesidade e diabetes), Câncer, Envelhecimento e Neurociências e, nesse caso, envolvendo os PPGs de Biologia de Sistemas, Farmacologia e Fisiologia. Assim, com base na análise dos projetos de pesquisa não existiria justificativa atualmente para a existência dos seis PPGs. Poderíamos ter no Instituto dois grandes Programas de Pós-Graduação com projetos mais integrados em torno desses dois grandes eixos. Outro ponto interessante a ser destacado  é que existe uma área, representada aqui pelo PPG de Imunologia, que permeia com a mesma intensidade os dois eixos citados anteriormente, servindo inclusive de intersecção entre esses dois eixos. Além do PPG da Imuno, que faz essa intersecção já citada, existem temas básicos também comuns a todos os PPGs, na medida em que tratam das bases da biologia celular, como a ação dos MicroRNAs, Função mitocondrial e Morte Celular.

 

Newsletter ICB:  A senhora considera que isso representaria um avanço?

Profª Maria Luiza: Eu sou defensora da integração em todos os níveis. Houve um momento em que foi importante para os PPGs a garantia da sua especificidade. Atualmente, a formação dos pós-graduandos deve ter uma abordagem transversal, com os estudantes ultrapassando as barreiras de cada PPG e até das unidades. Eles são desafiados a transitar pelas mais diversas áreas do conhecimento, dentro e fora da universidade. Isso ficou muito claro e mais fácil de ser evidenciado após a pandemia, quando o “mundo remoto” permitiu uma ampla conexão dos estudantes de todo o país ao redor das disciplinas oferecidas no ICB, e dos nossos estudantes, com disciplinas, cursos e outras atividades desenvolvidas em outras universidades do país e nas melhores universidades do mundo.

Assim, hoje os estudantes são estimulados a buscar uma formação mais ampla, mais plástica, e as oportunidades para aqueles com esse tipo de visão certamente serão maiores, tanto na academia, como fora dela.

 

Newsletter ICB:  A CPG vem discutindo estratégias para uma formação mais ampla, com esse viés?

Profª Maria Luiza: Sim, temos discutido isso com frequência em nossa CPG e buscado estratégias que nos aproximem de outras unidades da USP e permitam a criação de disciplinas com visão mais integrativa aos estudantes. Temos chamado esse projeto, que busca maior articulação com outras unidades, de “Construindo Pontes” e esse é o caminho. Recentemente, conseguimos criar no ICB uma disciplina de comunicação científica, ministrada por professor da Escola de Comunicação e Artes (ECA), voltada exclusivamente aos nossos estudantes. Formado em jornalismo e história pela USP, esse docente tem como linha de pesquisa a Comunicação da Ciência na Mídia Brasileira. A disciplina, oferecida pela primeira vez neste semestre aos pós-graduandos do ICB, foi também oferecida como disciplina-espelho aos estudantes dos nossos cursos de graduação. Outras iniciativas deste tipo, buscando articulação com outras unidades da USP, estão sendo discutidas e colocadas como futuras metas da Comissão de Pós-Graduação. É importante lembrar que, até um tempo atrás, sair da pós-graduação com boas publicações era a garantia para aprovação em concursos de provimento de cargo nas diferentes universidades públicas brasileiras. Hoje temos claro que as boas publicações são extremamente importantes e necessárias, mas não são suficientes!

 

Newsletter ICB:  Em sua opinião, quais são os próximos desafios da CPG do Instituto?

Profª Maria Luiza: Há vários. Vejo desafios em curto prazo, como aqueles relacionados à manutenção dos estudantes dos PPGs e das bolsas de pesquisa aos estudantes e, nesse sentido, vemos com muita apreensão as mudanças que vêm ocorrendo na CAPES nos últimos tempos. Essas mudanças criam uma enorme instabilidade em todo o sistema de pós-graduação no Brasil e um grande desestímulo aos estudantes para seguirem a sua pós-graduação. Sem contar a quantidade de ótimos pesquisadores, formados inclusive por nós, que estão buscando outros países nos quais a ciência é valorizada e representa investimento e não gasto aos governos. Ainda no curto prazo, vejo que precisamos trazer para o Instituto a discussão relativa às publicações em revistas de acesso aberto. Até quando conseguiremos bancar valores exorbitantes para conseguirmos publicar os nossos artigos? Existe um claro conflito de interesse das revistas científicas nesse binômio pagar-publicar. Além disso, a publicação dos nossos estudos em revistas predatórias leva a distorções que implicam e podem também interferir na qualidade dos nossos trabalhos.

Penso ainda que devemos refletir no âmbito do Instituto a respeito das recomendações para nortear a avaliação da produção da pesquisa científica, presentes tanto no Manifesto de Leiden, como na Declaração de São Francisco (Dora). A avaliação do Fator de Impacto das revistas, nas quais os trabalhos são publicados, vem caindo em desuso e alguns países já não utilizam essa métrica. Precisamos urgentemente trazer essa discussão para o âmbito do Instituto, pois em breve teremos que nos posicionar a respeito desses pontos que são emergentes e cuja discussão já foi iniciada em outras unidades e universidades.

 

Newsletter ICB:  E no médio prazo?

Profª Maria Luiza: Entendo que outro desafio em médio prazo voltado para a nossa CPG é a implementação de estratégias que permitam o melhor acompanhamento dos nossos egressos da pós-graduação do ICB. Ao participar do primeiro curso de Métricas-Fapesp, que realizei no ano passado, tomei conhecimento da realidade de outras unidades e PPGs em relação a estratégias para acompanhamento dos egressos. Na Esalq, por exemplo, existe um trabalho muito interessante nesse sentido, que resulta em um sentimento de pertencimento muito grande por parte dos estudantes que deixam a pós-graduação. Gostaria que os pós-graduandos do ICB tivessem esse mesmo sentimento. Formamos estudantes que vão para as mais diferentes regiões do país e para fora dele e isso se deve, certamente, à boa formação que tiveram aqui no ICB. Esses estudantes vão criar os seus próprios núcleos, atuando na formação de novos estudantes. Do ponto de vista social, essa talvez seja a maior contribuição que o ICB tenha a dar, no que se refere à pós-graduação.

 

Newsletter ICB:  A atração de estudantes com boa formação também seria um desafio?

Profª Maria Luiza: Sim, é outro desafio a longo prazo. Vejo como importante investir na atração de estudantes com boa formação, a partir das melhores universidades da América do Sul. Recebemos estudantes excelentes de universidades da Colômbia, do Chile, do Uruguai, mas ainda são poucos no Instituto; poderíamos certamente estabelecer mais parcerias nesse sentido. O número de estudantes de pós-graduação no ICB vem diminuindo com o tempo. Em 2001 tínhamos 615 estudantes, antes disso chegamos a alcançar os 700 pós-graduandos; atualmente temos 485. Novamente, se buscássemos estratégias institucionais para alavancar essa atração de estudantes, tendo como perspectiva esses dois blocos de linhas de pesquisas citados previamente, acredito que não dividiríamos esforços e ganharíamos mais força. Um de nossos PPGs faz isso com bastante maestria, no que diz respeito à atração de alunos do exterior, uma vez que tem dentro de seu quadro de orientadores um professor estrangeiro que mantém contato com a sua instituição de origem, realizando os seus processos seletivos, inclusive com o auxílio do consulado daquele país. Seria ótimo se pudéssemos repetir esse modelo nas demais áreas do ICB.

 

Newsletter ICB:  A senhora citou o Curso de Métricas-Fapesp. Poderia falar um pouco mais a respeito? Qual a sua importância e como isso poderia contribuir com a pós-graduação?

Profª Maria Luiza: Esse curso foi uma experiência fantástica para mim e absolutamente o recomendo a todos os colegas que pensam em atuar, em algum momento, em um cargo de liderança na Universidade, seja ele junto a algum colegiado ou junto às chefias departamentais. Participei da primeira turma do curso, que ocorreu de março a novembro de 2020, durante a pandemia; de forma remota. É um curso de atualização em métricas de desempenho acadêmico e comparações internacionais, que faz parte do Projeto Métricas, organizado pelo Prof. Jacques Marcovitch, apoiado pela Fapesp. Nesse curso nós tivemos oportunidade de aprender a respeito dos vários indicadores de desempenho relacionados às diferentes atividades da universidade, de refletir sobre os diversos modelos de gestão das universidades estaduais paulistas e ainda sobre o impacto social das nossas atividades, tendo como foco os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que fazem parte da agenda ONU 2030. Foi muito interessante, um aprendizado intenso sobre os diferentes aspectos que permeiam a governança universitária.

 

Newsletter ICB:  Dentro da governança universitária, a senhora parece gostar bastante da parte administrativa relativa à pós-graduação…

Profª Maria Luiza: Eu estou vinculada à pós-graduação desde 2005, quando pela primeira vez passei a fazer parte da Comissão de Pós-Graduação do então Programa de Pós-graduação em Anatomia Estrutural. De lá para cá, nunca mais me desliguei da pós-graduação; isso tem me dado enorme prazer, grandes aprendizados e inúmeros desafios. Juntamente com a secretaria de pós-graduação e com os demais membros da CPG temos empenhado esforços para organizar administrativamente a pós-graduação do ICB, buscado integrar cada vez mais os programas e estreitar o máximo possível o canal de comunicação com a PRPG. Tenho aprendido muito durante todo esse tempo e conhecido pessoas nas mais diversas áreas que muito tem contribuído com o meu contínuo processo de formação.