Em parceria com farmacêuticas brasileiras, pesquisadores testam medicamentos já existentes, agilizando a descoberta de um tratamento para a doença.
07/04/2020
O Laboratório Phenotypic Screening Platform, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP), começou na última semana (30/3) a testar medicamentos para combater a Covid-19. Referência mundial em triagem fenotípica para reposicionamento e descoberta de novos fármacos, o grupo possui uma parceria com a Eurofarma, que cedeu sua biblioteca de cerca de 1.500 fármacos para a pesquisa, e. Além disso, a equipe vem firmando novas parcerias com outras farmacêuticas para a triagem dos medicamentos já comercializados no Brasil, e também para testar produtos para a prevenção da Covid-19 em desenvolvimento por start-ups brasileiras.
Segundo Lucio Freitas-Junior, coordenador do laboratório, a técnica de triagem fenotípica consiste em avaliar a atividade antiviral de compostos em células infectadas com o SARS-CoV-2, em testes in vitro. As células são colocadas em placas de ensaio e cada uma recebe diferentes compostos. As análises são feitas de modo automatizado, com a tecnologia High Content Screening, que permite analisar dezenas de milhares de fármacos simultaneamente toda semana. O pesquisador estima que em cinco semanas já terão os resultados dos testes de mais de 2500 compostos, e a partir desse momento será possível testar até 4 mil compostos por semana.
As moléculas estudadas são fármacos já aprovados para o tratamento de outras doenças e produzidos em território brasileiro. “A grande vantagem é agilizar o processo de descoberta de um tratamento. Um medicamento pode levar até 10 anos para ser produzido, testado e aprovado. Nós não temos esse tempo. Precisamos agir agora”, explica o pesquisador.
Por se tratar de um vírus que causa doença potencialmente letal e para o qual ainda não existem vacinas ou tratamento específico, o estudo de triagem fenotípica é desenvolvido no Laboratório de Nível de Biossegurança 3 (NB3) do Departamento de Microbiologia, coordenado pela professora Ana Marcia Sá Guimarães. A equipe de Freitas-Junior já foi treinada para atuar no laboratório de alta segurança.
O projeto foi possível graças ao cultivo do novo coronavírus feito pelo grupo do pesquisador Edison Luiz Durigon, também do ICB, que recebeu amostras dos primeiros pacientes infectados no final de fevereiro, enviadas pelo Hospital Albert Einstein. “Nós temos o vírus sendo produzido na quantidade necessária para as triagens, o laboratório NB3 e a equipe altamente especializada em descoberta de fármacos e triagem fenotípica, que é uma tecnologia muito específica. Esses são os nossos três pilares”, destaca Freitas-Junior.
A iniciativa se destaca pela participação de diversos especialistas em diferentes áreas de conhecimento que estão trabalhando juntos para a descoberta de antivirais para Covid-19 – como Luís Carlos de Souza Ferreira, diretor do ICB, e os virologistas Edison Luiz Durigon e Paolo Zanotto. Também participam do estudo Carolina Borsoi Moraes, especialista em triagem fenotípica da UNIFESP, além de pesquisadores do Instituto de Física e do Instituto de Química da USP de São Carlos e da UNICAMP.
Além disso, o grupo do ICB vem recebendo compostos para triagem de diversos grupos de todo o Brasil e faz parte de consórcios internacionais que buscam novos fármacos para tratamento da Covid-19. “Também é missão da Universidade atuar junto à sociedade para atender a demandas de saúde. Por isso, a plataforma de triagem fenotípica do ICB busca estabelecer parcerias com grupos de pesquisa do Brasil e do exterior, bem como empresas nacionais e internacionais, para o teste de novos candidatos a fármacos e de produtos destinados à prevenção da covid-19 e outras doenças virais”, afirma Freitas-Junior.
Intervenções em outras epidemias – O grupo de Lucio Freitas-Junior é um dos líderes mundiais na área de triagem fenotípica para doenças negligenciadas e há cerca de 15 anos se dedica ao descobrimento de fármacos para malária, leishmaniose, doença de Chagas e dengue, além de doenças emergentes, como Chikungunya e Zika. O pesquisador trabalhou durante oito anos no Instituto Pasteur da Coreia do Sul e liderou o Center for Neglected Diseases Drug Discovery, onde as triagens fenotípicas foram desenvolvidas pela primeira vez para diversas dessas doenças.
Durante o surto da Febre Amarela em 2016, em São Paulo, seu laboratório descobriu que um remédio usado contra hepatite C era eficiente no tratamento da doença. O fármaco chegou a obter sucesso em testes em pacientes no Hospital das Clínicas. O grupo também já identificou fármacos capazes de destruir o vírus da Chikungunya em testes in vitro, além de ter identificado fármacos para reposicionamento para tratamento da Zika, em um trabalho pioneiro em todo o Brasil.
Por: Aline Tavares
Acadêmica Agência de Comunicação