Após o NUCOM-ICB ter recebido o texto abaixo da Comunicação do CEPID B3, que trata da participação de alunos do ICB-USP na maior competição mundial de Biologia Sintética e Biotecnologia, divulgamos abaixo a íntegra dessa matéria produzida por eles, devido à sua qualidade informativa:
Entre os dias 23 e 26 de outubro, uma equipe formada por alunos de graduação e pós-graduação da Universidade de São Paulo (USP) concorrerá a prêmios na Competição Internacional de Engenharia de Sistemas Biológicos, a iGEM. O evento é o maior do gênero a nível mundial e, em 2024, ocorrerá em Paris, capital da França. O time é o único representante da USP na competição e defenderá uma proposta de engenharia de microrganismos, cujos resultados podem contribuir para reduzir o custo do tratamento da Doença de Gaucher no Sistema Único de Saúde (SUS).
O grupo tem desenvolvido o projeto desde o início de 2024, sob a supervisão das professoras Cristiane Guzzo e Rita Café Ferreira, ambas do ICB e do Centro de Biologia de Bactérias e Bacteriófagos (CEPID B3), em colaboração com o pesquisador Mário Henrique, também do ICB. O trabalho envolve a manipulação de duas espécies de microrganismos, a bactéria Escherichia coli e a levedura Saccharomyces cerevisiae, para que sejam capazes de produzir proteínas humanas, como a GCase — uma enzima sintetizada naturalmente no corpo humano cuja deficiência está associada à Doença de Gaucher.
Davi Merighi, coordenador científico do time iGEM USP 2024, explica que essa enzima já pode ser fabricada artificialmente por células isoladas de cenouras, hamsters ou humanos, mas a nova produção por bactérias e leveduras deve reduzir consideravelmente os custos, que, embora não sejam repassados para os pacientes, são altos para o SUS. “O foco do projeto é engenhar os microrganismos, mas já temos também um produto com potencial escalável que pode impactar muito positivamente o orçamento do SUS no futuro”, afirma o pesquisador.
O grupo ressalta que um dos principais diferenciais do projeto é a capacidade de aplicar os microrganismos já modificados por eles no desenvolvimento de trabalhos futuros, favorecendo o avanço de áreas como a Biologia Sintética e Biotecnologia. Um dos avanços previstos é a adaptação da maquinaria responsável pelo processo de glicosilação em leveduras e a construção desse mesmo caminho, a partir do zero, em bactérias. O mecanismo de glicosilação é usado pelas células humanas para adicionar açúcares específicos a proteínas, um passo essencial para que certos tipos, como a enzima GCase, cumpram suas funções biológicas. Nesse contexto, o objetivo é fazer com que os microrganismos consigam usar essas vias de forma semelhante aos humanos. “A vantagem é que essas novas vias servirão como base e poderão ser ajustadas por outras equipes no futuro, permitindo a produção e a ligação dos açúcares que precisarem”, salienta Merighi.
A equipe da USP apresentará a proposta remotamente a uma bancada internacional de jurados no dia 25 de outubro e concorrerá com outros 437 times de todo o mundo. A proposta pode ser premiada em diversas categorias, incluindo medalhas pela produção dos produtos, melhor comunicação com o público e melhor novidade. “Estamos bem focados em levar o máximo de bons resultados possíveis”, diz Caue Gonçalves, coordenador administrativo da equipe e aluno de Iniciação Científica no ICB. “Estamos demonstrando a utilização de uma enzima de forma inédita, que não foi proposta até hoje. Além disso, ainda estamos trabalhando em experimentos em bancada e vamos apresentar novos resultados”, complementa o estudante.
O futuro do projeto – Merighi destaca que a apresentação na iGEM 2024 não deve marcar o fim do projeto, mas sim um momento de trocas com outros pesquisadores para alavancar ainda mais os resultados. “No próximo ano, estamos pensando em focar na caracterização dessa enzima. Queremos entender o quão boa ela é em comparação com o que temos disponível comercialmente hoje”, aponta, acrescentando os planos da equipe de patentear os produtos desenvolvidos e transformar o projeto em uma empresa startup. “Estamos em contato com empresas e com times que já participaram da iGEM, pensamos em todos os problemas que podem acontecer e já planejamos soluções”, lista o pesquisador.
Financiamento e Desafios – Os custos para a participação da equipe na competição foram financiados por um edital oferecido pela USP, além de recursos concedidos pelo ICB e pela Pró-Reitoria de Graduação da Universidade. Ainda assim, segundo Gonçalves, o maior desafio para a execução do projeto foi financeiro. “Além do valor das taxas, precisaríamos financiar uma viagem internacional para apresentar presencialmente”, explica. “Muitos times lá fora conseguem se preocupar apenas com o projeto, mas nós passamos o ano todo preocupados em arrecadar fundos”, recorda.
Levando em conta as dificuldades encontradas, a alternativa encontrada foi conduzir a apresentação remotamente. A equipe está confiante para a competição e espera obter suporte para apresentar os desdobramentos do trabalho presencialmente na próxima edição da iGEM, prevista para 2025.