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“Dormir Pesquisador e Acordar Professor”: O Desafio da Formação Docente na USP

Após o NUCOM-ICB ter recebido o texto abaixo do prof. Gabriel Padilla, que trata sobre a participação de docentes do ICB na 1ª Semana Pedagógica da USP, divulgamos abaixo a íntegra dessa matéria produzida por ele, devido à sua qualidade informativa:


As Pró-reitorias de Graduação e de Pós-Graduação da USP, por meio do Programa de Desenvolvimento Profissional Docente (PDPD), realizou a 1ª Semana Pedagógica, entre 17 e 21 de fevereiro, estimulando os seus docentes no compartilhamento de experiências e discussões sobre os desafios pedagógicos na Universidade. Foi com grande prazer que docentes e pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB-USP), do campus São Paulo, contribuíram com o evento, trazendo para uma roda de conversa o tema intitulado “Engajamento Docente: O caminho para transformar a sala de aula universitária”. Em formato online, o painel teve a participação de docentes das mais diversas áreas de atuação e de diferentes campi da universidade. 

 

O Prof. Gabriel Padilla, do Departamento de Microbiologia, iniciou a moderação do debate e trouxe em sua fala a importância desse tipo de evento para os docentes. Ele ressaltou, que em seus 34 anos de USP, foi a primeira vez que sentiu comprometimento com a formação docente.  

 

Em seguida, comentou-se sobre os desafios significativos que a formação docente no ensino superior ainda enfrenta, sendo um deles, os concursos de seleção para vagas de docência, que priorizam considerações como o índice H e o fator de impacto das publicações científicas. Essa reflexão foi trabalhada pela Dra. Renata L. A. Furlan, pesquisadora colaboradora no Departamento de Microbiologia e coordenadora do Projeto de Extensão Universitária Biocientista Mirim/ICB-USP, que participou da roda de conversa junto com os docentes do Instituto. 

 

A pesquisadora destacou como esse modelo de avaliação perpetua uma visão tradicional da educação, em que a seleção de um docente é valorizada apenas por seu conhecimento técnico, e não pelas demais habilidades e competências que permeiam a profissão. Essa abordagem contrasta com um modelo educacional mais inovador, que coloca a aprendizagem do estudante no centro do processo. 

 

Para que esse modelo seja implementado nas salas de aula da universidade, os docentes têm que necessariamente passar por processos de formação pedagógica, para evitar o choque de realidade inicial em que o sujeito dorme engenheiro e acorda professor, ou dorme arquiteto e acorda professor, assim como um aluno que, de repente, se torna professor. Esse processo já não se sustenta nos dias de hoje. O ensino exige preparo, formação pedagógica e um compromisso contínuo com a educação, tornando essencial a valorização e qualificação dos docentes em todas as áreas do conhecimento.  

 

Além disso, Furlan ressaltou a necessidade de ressignificar o ensino, levando em conta a complexidade e a diversidade presentes nas salas de aula. Para ela, um bom docente não se define apenas pelo domínio do conteúdo, mas também pela habilidade de promover um ambiente de aprendizado dinâmico, acessível e significativo para os estudantes. Esta discussão reforça o ressignificar dos critérios de valorização dos docentes no ensino superior, incentivando uma formação que vá além da produção científica e contemple, de fato, a excelência no ensino.

 

Dando continuidade ao tema da “Roda de Conversa”, a Profa. Rita Café Ferreira do departamento de Microbiologia, trouxe sua experiência com o Projeto #Adote: Adote uma Bactéria, que aplica, há mais de dez anos, na disciplina de bacteriologia do curso de graduação de Ciências Biomédicas do ICB-USP. Ela enfatizou que o Adote uma Bactéria é um exemplo de iniciativa engajadora, pois estimula ativamente a participação dos alunos no ensino de microbiologia de maneira criativa e interativa utilizando metodologias ativas, como mídias sociais, jogos e atividades lúdicas, colocando os estudantes no centro do processo de aprendizado, incentivando-os a assumir um papel protagonista na construção e disseminação do conhecimento científico.

 

Concluindo a discussão, o Prof. Fernando Abdulkader lembrou que o engajamento docente passa pela percepção por parte do educador de que há também engajamento discente, num ciclo virtuoso. Apontou também que não há receita universal para que o engajamento docente e discente aconteça, mas alguns princípios gerais foram sugeridos pelo professor, como o docente procurar enfatizar nas suas aulas os aspectos dos assuntos que tem de tratar com os quais mais se encanta – pois seu entusiasmo tende a contaminar os estudantes também. 

 

Ademais, sugeriu uma “leitura” frequente do estado de espírito da sala, sendo maleável quanto à sequência dos assuntos a serem abordados e ao número de intervalos dentro dos períodos de aula. Um aspecto que por vezes acaba sendo negligenciado é o de que a informação visual tem preponderância em relação a outras modalidades sensoriais usadas para mediar a comunicação entre pessoas. Isso implica em que, naturalmente, os estudantes foquem sua atenção nos slides do que no discurso do docente. Assim, o professor recomendou que, na medida do possível, os docentes procurem fazer animações simples em suas sequências de slides, ou considerem usar a lousa, pois dessa forma estudantes e docentes estão na mesma velocidade durante a aula. 

 

Abdulkader concluiu resumindo sua fala com a recomendação de Richard Feynman, prêmio Nobel em física e educador do século XX, de que um professor, ao preparar uma aula, deveria considerar o que quer que os estudantes aprendam e por que quer que o aprendam (ou seja, as habilidades e competências). A partir daí, a estratégia didática tende a aparecer naturalmente, a partir do bom senso, experiência acumulada e entusiasmo do docente.