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Alunos do ICB-USP conquistam medalha de prata na maior competição de biologia sintética do mundo

Equipe formada por membros de diversos institutos da USP desenvolve mecanismo para microrganismos produzirem proteínas humanas.


Equipe do projeto “Glicosinside out”

Equipe do projeto “Glicosinside out”

O projeto “Glicosinside out”, desenvolvido por alunos do Instituto de Ciências Biomédicas da USP (ICB-USP) em conjunto com colegas de outros institutos da USP, ganhou a medalha de prata na International Genetically Engineered Machine (iGEM). Trata-se da principal competição mundial de biologia sintética voltada para alunos de graduação e pós-graduação. A premiação ocorreu no dia 2 de outubro, em evento realizado em Paris.

 

O projeto, sediado no Laboratório de Estrutura e Evolução de Proteínas (LEEP) do ICB-USP, tem como objetivo criar, por meio da engenharia genética, bactérias e leveduras capazes de glicosilar proteínas de forma similar ao que ocorre em células humanas. Essa iniciativa permitirá diminuir os custos de tratamentos médicos da doença de Gaucher, além de ter potencial para ser usada em terapias com proteínas humanizadas, desenvolvimento de vacinas e testes diagnósticos.

 

Competição iGEM – A medalha foi muito comemorada pela equipe, já que o projeto ainda está em seu primeiro ano de desenvolvimento, como conta o aluno do ICB-USP Davi Merighi: “esse foi um resultado bastante satisfatório, porque o nosso projeto foi planejado para ser executado em dois anos, então, uma medalha de prata já [no primeiro ano] sugere que estamos indo pelo caminho certo”.

 

A professora do ICB-USP Cristiane Rodrigues Guzzo Carvalho acrescentou que a medalha é uma grande conquista, principalmente, porque a equipe começou o projeto do zero e este primeiro ano foi mais focado no planejamento.

 

Junto com a alegria descrita pela equipe com a conquista da medalha se soma um misto de emoções que os membros contaram ter sentido durante o desenvolvimento do projeto. O nome “Glicosinside out” é um trocadilho com o filme “Divertidamente”, que tem como tema central as emoções. Inspirado no longa, o grupo produziu um vídeo de apresentação do projeto. Assista aqui.

 

A equipe sediada no ICB-USP foi um dos quatros representantes brasileiros no IGEM 2024. O grupo multidisciplinar é orientado pela professora Cristiane Rodrigues Guzzo Carvalho e tem membros de diferentes institutos e campus da universidade. Conheça aqui o time do projeto.

 

A equipe surgiu em 2012 e desde então apresentou diversos projetos no iGEM com professores orientadores e institutos sede diferentes.

 

Projeto – A ideia do projeto nasceu quando os alunos Cauê Augusto Boneto Gonçalves e Guilherme Camargo Pompeu e Silva, que já faziam parte da equipe, levaram para Cristiane a ideia de desenvolver no Laboratório de Estrutura e Evolução de Proteínas um projeto para o iGEM. A professora propôs desenvolver uma tecnologia para a criação de bactérias que produzissem proteínas de forma similar as proteínas produzidas pelos seres humanos.

 

Cristiane notou a necessidade de criar essa tecnologia durante a pandemia de Covid-19, quando ela trabalhou em uma pesquisa para desenvolver testes e vacinas para combater o novo coronavírus. A ideia surgiu da necessidade de os cientistas disporem de proteínas que eram solúveis do SARS-CoV-2 e outras insolúveis. Porém, o processo para produção das proteínas comerciais é muito caro, o rendimento é baixo e a tecnologia vem de fora do Brasil.

 

Esse processo tem um alto custo. Atualmente, para produzir proteínas similares às humanas é preciso utilizar organismos eucarióticos, e os laboratórios costumam recorrer a tecidos celulares de insetos, células de plantas e células humanas ou de outros mamíferos. Porém, esses organismos demoram muito para crescer e produzem uma quantidade baixa de proteína, o que encarece muito o processo, além dos insumos para o crescimento dessas células serem muito caros.

 

A professora encontrou como solução a produção das proteínas em um modelo microbiano, como as bactérias e as leveduras, já que elas se desenvolveriam mais rápido e os cientistas conseguem modificar esses microrganismos para superexpressar proteínas, ou seja, produzir uma grande quantidade desse material. Esse processo baratearia a produção e, por ser uma tecnologia nacional, tornaria o processo financeiramente mais viável.

 

O desafio do projeto é que as bactérias e leveduras produzam proteínas humanas. Para isso, esses microrganismos passaram pelo processo de engenharia genética, no qual os cientistas modificam geneticamente um ser vivo.

 

Esse processo foi necessário, pois originalmente esses microrganismos produzem proteínas com uma arquitetura diferente das proteínas humanas e, muitas vezes, não realizam a glicosilação, que é a adição de açucares para a produção das proteínas com características humanas.

 

Com a modificação genética, os microrganismos passarão a ser capazes de glicosilar seguindo a arquitetura das proteínas humanas e, assim, reproduzir essas substâncias de forma correta.

 

Para testar a eficiência desse método, a equipe escolheu produzir a enzima glicocerebrosidase, utilizadas no tratamento da doença de Gaucher, em que as enzimas dos pacientes não funcionam e eles precisam receber essas proteínas produzidas artificialmente.

 

Esse tratamento é disponibilizado gratuitamente pelo SUS, mas a um custo elevado para o sistema de saúde. O único mecanismo de produção dessas enzimas atualmente utiliza tecido celular de células de carcinoma humano imortalizado, células de ovário de hamster chinês e células de cenoura geneticamente modificadas, o que eleva o preço do procedimento.

 

Com o Glicosinside out, o tratamento da doença de Gaucher pode ser no mínimo dez vezes mais barato para o SUS. Para calcular o valor exato do mecanismo, ainda é necessário esperar o resultado experimental, que deve acontecer no segundo ano do projeto.

 

Próximos passos – A partir do ano que vem, a previsão é de conseguir obter a proteína glicocerebrosidase a partir dos microrganismos geneticamente modificados e avaliar a qualidade do processo e das proteínas obtidas. A partir disso, a equipe pretende patentear a tecnologia e oferecer ao SUS a proteína por um preço mais barato.

 

No segundo ano do projeto, o time também almeja conquistar uma nova medalha no iGEM. A professora Cristiane espera que seja possível enviar alguns alunos do grupo para participar presencialmente da competição que acontece em Paris.

 

A equipe está em busca de doações que possam custear a ida dos alunos. Além disso, ajudas financeiras também serão utilizadas para o desenvolvimento do projeto, que atualmente não conta com nenhuma verba.

 

As pessoas interessadas em fazer uma doação devem entrar em contato com a equipe por meio do e-mail crisguzzo@usp.br.

 

Ana Carolina Guerra | Acadêmica Agência de Comunicação e NUCOM-ICB